Ressuscita-nos
Vestindo uma camisola
de linho parda,
parada, cansada, desconectada
os bicos dos seios tocando delicadamente
a trama do tecido, provocando arrepios
e lembranças sem sentido,
Meus pés sentem a grama quente e
meus olhos avistam o pôr do sol por entre
as folhas e troncos aprumados,
ao longe, no rio
retos e envergados
semelhantes aos seus desafios
A piscina por limpar,
cadeiras com folhagens
de outras primaveras,
abandonada
uma casa cheia de histórias
não contadas
dos filhos que não chegaram
dos invernos que se passaram
na vida que deixamos por acabar
Aceitamos nos encontrar
no jardim abandonado
de nossa alma
por salvar
De costas, eu fito as copas das árvores
na brisa do fim de tarde de verão
nós morremos,
mas não pode ser
em vão
Só a camisola e nada mais,
esperando ansiosamente
você chegar por trás
rezando para que venha,
meu coração acelera
quando sinto seu toque,
você acreditou
em nós, em nosso amor
ou o que restou
Doentes, pálidos
não temos mais nada,
apenas o que sobrou
da força em nossos corpos cansados
resistindo bravamente,
unidos por um fio
desmembrado, rasgado,
num imenso vazio
Continuo inerte, sentindo suas mãos
tocarem as minhas mãos
um beijo quente
e uma lágrima
que cai de repente
nenhuma palavra, nada a dizer
só nos aninhamos
para viver
o pouco que nos resta
e alvorecemos
calados, juntos
No nosso para sempre
de promessas, mansos
sem lutas ou disputas
apenas o bem-querer,
e a esperança
de existir com o que sobrou
de mim e do que
restou em você.
